Dias atrás um estranho e-mail caiu na minha caixa postal. O remetente se autointitulava Vitoriamario. Pelo fato de ser meu/minha xará despertou-me atenção redobrada. O e-mail apresentava o seguinte título Vazio – Empty – Vide e o conteúdo era uma página em branco. Decidi então, mesmo com uma leve impressão de que poderia estar perdendo meu tempo, tentar entender do que se tratava. A principio, mesmo conhecendo ações de gênero antiarte, achei que não passasse de gozação de alguém, que por pura falta do que fazer, quisesse caçoar dos outros como a velha e famosa piada do “Conhece o Mário?". Bastou uma leve pesquisa num destes sites de busca e logo percebi indícios de que se tratava de algo a mais do que mera apropriação de uma infame chalaça pseudo-picante-anti-picasso. O tal pseudônimo está diretamente ligado ao atual ativismo político-cultural de ponta encontrado na rede: Zapatismo, Hackerismo, Critical Art Ensemble, Luther Blissett, Hakim Bey, Zerowork, Nadaismo, entre outros ismos de inúmeros istmos contraculturais. Em meio aos inúmeros sites apontados pela pesquisa encontra-se um zine intitulado Apodrece e Vira Adubo que contém uma avalanche de intervenções e textos no mínimo extravagantes. São plágios, detournments, colagens, combines, found art ou found text, intertextos e apropriações que vão de entrevistas, manifestos (inúmeros), textos literários, proposições artísticas, ensaios sociológicos, releases de grupos musicais e até notícias nonsenses, como a suposta execução de um bruxo em plena praça pública ou o pirata que vivera no litoral do Paraná nos idos de 1900 conhecido como Vitoriamario (talvez daí o nome Vitoriamario). Entre as muitas dislexias provocantes cito uma que resume bem o espírito da coisa: Hoje não fiz nada. Quem sou? Quem se importa? O que importa é: Quem é você? Perdido na frente de pixels e um uma caixa cheia de pó de fósforo procurando respostas para sua existência? Quer seu rosto neste espelho? Quer sua foto = a minha foto? Um nome um pai perverso um útero fálico pra se guardar. Critique-me, xingue-me, este não é seu espaço, me mostre o seu: pois quero violá-lo! Não me venha com leis dialéticas de sentido. Seja-me. Já! APAREÇA VITORIAMARIO!!! Pode-se dizer que Vitoriamario é o propulsor de um novo movimento contracultural cuja essência baseia-se na tentativa da completa eliminação do maior de todos os mitos que o homem já construiu, o Mito da Identidade. Este, segundo a visão vitoriamariana, é de todos os tabus que nos cercam o mais encalacrado e portanto, o mais difícil de ser desmantelado. O referido mito na verdade é uma espécie de variação pós-imperialista do Mito de Eco e Narciso, no qual o protagonista é o próprio indivíduo. É elevando cada um ao status de mito que Vitoriamario desenvolverá suas teorias as quais o individuo não passa de um carcereiro de seu próprio significado supervisionado pelas esferas do poder (estado, igreja, família, guetos, colisões virtuais, etc.) reguladoras dos códigos morais, estéticos, políticos, etc. Em meio a esta total descrença face-narcísica é que surge o movimento NÃOEU (NOID) com sua biruta tentativa de reposicionar o homem sem qualquer descompasso psíquico ou referencial, uma vez que para Vitoriamario o homem não é um sintoma como os discípulos de Freud o definem ou como a sociedade do consumo o quer. Segundo Vitoriamario: Suas possibilidades são infinitamente magníficas, uma vez recombinadas por uma outra escala (piédrica) de valores signo simbólicos automaticamente surgirá uma nova dinâmica dada pela vitória da percepção humana.
O movimento aponta em seus ensaios crítico-teóricos entre muitas coisas a banalização de toda e qualquer autorreferência, recombinação simbólica desconstrução de comportamentos egocêntricos, fim às reverências, destruição completa da história linear, dos conceitos de originalidade e autoria. Como ações e intervenções o NÃOEU atua em anomeações de arquivos, plágio de textos e documentos (inclusive de outros grupos ativistas), terrorismails poéticos, edição de videos e salto em abismos. Tudo isto podendo ser encontrado em muitos dos sites Vitoriamario. Diante do que propõem movimento NÃOEU, seja ele utópico ou não, vale dizer que é mais uma tentativa da possível transformação do comportamento humano para muito além dos moldes ególatras por hora reinantes nas sociedades espetaculares atuais.